O advogado Túlio Belchior da Silveira passou da condição de testemunha a de investigado, após silenciar na maior parte de seu depoimento à CPI da Pandemia, nesta quarta-feira (18). Silveira optou pelo direito ao silêncio para não se incriminar, amparado por habeas corpus do Supremo Tribunal Federal (STF), alegando o sigilo profissional do advogado, mas sua postura indignou vários senadores.
Silveira afirmou à CPI ter sido um simples advogado contratado pela Precisa Medicamentos para assessoria jurídica na negociação da vacina indiana Covaxin, do laboratório Bharat Biotech, junto ao Ministério da Saúde — cancelada após suspeitas de corrupção. Porém, em trocas de mensagens obtidas pela CPI, Silveira atuou como funcionário do Departamento Jurídico da Precisa.
Silveira participou de audiência pública para debater a vacinação no Senado, em março deste ano, na condição de “gerente de contratos” da Precisa. Além disso, abriu um escritório de advocacia três dias antes da assinatura do contrato da vacina.
Logo no início do depoimento, o advogado negou-se a prestar o juramento de dizer a verdade. Foi advertido pelo Presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), de que não poderia repetir a atitude de outro depoente, o empresário Carlos Wizard, que se manteve em silêncio ao longo de todo o depoimento, no dia 30 de junho.
“Nenhum direito fundamental é absoluto, muito menos pode ser exercido para além de suas finalidades constitucionais”, destacou Omar Aziz.
Silveira chegou a responder as primeiras perguntas do relator, senador Renan Calheiros (MDB-AL), sobre a natureza de sua relação com a Precisa. Quando os questionamentos começaram a se aprofundar em minúcias da negociação, no entanto, o advogado começou a se valer do habeas corpus. Renan Calheiros (MDB-AL) criticou com veemência a decisão da testemunha de se calar: “O silêncio do depoente é um silêncio incriminador, porque, tendo oportunidade, não respondeu a perguntas que não tinham nada a ver com a negociação da Covaxin, nem com a Precisa.”
A senadora Simone Tebet (MDB-MS), uma das requerentes da convocação do advogado, fez uma detalhada exposição da possível participação de Silveira em irregularidades na negociação da Covaxin, como imprecisões e contradições em detalhes do contrato e das invoices (faturas). Segundo ela, a Precisa não possuía procuração da Bharat que a legitimasse como negociadora de vacinas com o governo brasileiro.
“Achei que V.Sa. viria para esclarecer, com o seu currículo. Se todos aqueles interessados em levar vantagem indevida à custa da dor e da morte de centenas de milhares de pessoas tivessem ouvido o dr. Túlio professor de direito administrativo, não teriam assinado esse contrato, que na melhor das hipóteses é nulo de pleno direito”, concluiu a senadora, referindo-se ao currículo acadêmico do depoente.
A reunião foi suspensa por Omar Aziz durante uma hora. Na retomada, Renan Calheiros anunciou que o depoente passara à condição de investigado. Integrante da base do governo, Marcos Rogério (DEM-RO) afirmou concordar com a mudança, mas ressalvou que o relator deveria tê-la submetido à deliberação da Comissão. O senador de Rondônia disse ainda que Túlio Silveira estava se valendo da condição de advogado para obstruir a investigação, o que constituiria crime.
O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues, exibiu trecho da audiência pública do Senado, em 23 de março, na qual Túlio Silveira participou como gerente de contratos da Precisa. Tanto Randolfe, quanto a senadora Leila Barros (Cidadania-DF), questionaram o depoente sobre seu vínculo com um grupo ligado ao deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, ex-ministro da Saúde (governo Temer) e acusado de influência em negociações suspeitas para a compra de vacinas. Como no restante do depoimento, Silveira manteve o silêncio. Ele não respondeu tampouco aos questionamentos de Humberto Costa (PT-PE), Zenaide Maia (Pros-RN) e Eduardo Girão (Podemos-CE), entre outros senadores.
Ricardo Barros investigado
O relator Renan Calheiros anunciou durante a reunião que o deputado Ricardo Barros passou à condição de investigado pela Comissão. Segundo Renan, “é necessário apurar de maneira aprofundada suas relações e ligações políticas e empresariais nas negociações e possíveis associações com servidores civis e militares do Ministério da Saúde investigados pela Comissão, sem falar em ocasionais conexões com Roberto Dias [ex-diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde] e com os sócios das empresas de Francisco Maximiano, entre elas a Global e a Precisa Medicamentos”.