O secretário especial do Tesouro e Orçamento do Ministério da Economia, Bruno Funchal, alertou a Comissão Mista de Orçamento nesta quarta-feira (18) sobre os riscos de a inflação e o crescimento de precatórios (dívidas estatais com sentença judicial definitiva) comprometerem os investimentos para 2022. Deputados de diferentes partidos, no entanto, fizeram ressalvas à Proposta de Emenda à Constituição dos Precatórios (PEC 23/21), apresentada pelo governo como uma solução para o aumento de R$ 34,4 bilhões nessas dívidas.
Com a melhora da economia, as projeções para o teto de gastos no ano que vem cresceram de R$ 1,592 trilhão, segundo o projeto aprovado da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), para R$ 1,610 trilhão. Em comparação, o teto em 2021 é de R$ 1,486 trilhão. Com relação ao Orçamento de 2021, haveria um adicional de R$ 30,4 bilhões que poderiam ser usados em investimentos, já que as despesas do projeto de Lei Orçamentária para 2022 estão previstos em R$ 1,579 trilhão.
O crescimento do PIB em 2021, inicialmente estimado em 3,5%, agora é projetado em 5,3%, com uma inflação de 6,2%. Para 2022, o cenário é de crescimento de 3,5% e inflação de 3,5%.
Riscos
Bruno Funchal teme que a inflação deste ano cresça acima da estimativa atual do INPC. Isso causaria impacto nas despesas obrigatórias indexadas, como o salário mínimo e os gastos sociais. O secretário ainda afirma que os investimentos podem diminuir por conta do atendimento do mandado de injunção no STF para o Renda Mínima Universal e eventuais modificações na reforma tributária (PL 2337/21), em tramitação no Congresso, que poderiam reduzir os resultados primários por causa da perda de arrecadação e aumento de gastos.
Entretanto, a principal preocupação do governo é com o aumento das sentenças judiciais para pagamento de precatórios, o que motivou o encaminhamento ao Congresso da PEC 23/21. O crescimento nos precatórios é de R$ 34,4 bilhões acima do projetado inicialmente. “O precatório vai comer quase todos os investimentos. Esse aumento de R$ 34,4 bilhões equivale ao orçamento de 16 ministérios. É um valor muito grande e precisa ser discutido”, comentou.
As sentenças tiveram um salto de R$ 51,9 bilhões, em 2020, para R$ 54,7 bilhões, em 2021. A projeção para 2022 é de R$ 89,1 bilhões, bem acima da estimativa inicial de R$ 58 bilhões. O crescimento é ainda mais expressivo no longo prazo.
Em 2010, as despesas com precatórios eram de R$ 13,9 bilhões, representando somente 11% do valor de despesas discricionárias. Em 2022, serão equivalentes a 68% desses gastos.
PEC
Para Funchal, a PEC dos Precatórios pode trazer maior previsibilidade ao vincular o volume de pagamentos ao teto de gastos. Entre os principais instrumentos da proposta, está o parcelamento de precatórios. No texto, apenas 8.771 de um total de 264.717 precatórios seriam atingidos pelo parcelamento, o equivalente a 3,3%.
O secretário observou que nenhum precatório abaixo de R$ 455 mil seria parcelado no exercício de 2022, e todos os precatórios de pequeno valor, abaixo de R$ 66 mil, ficariam de fora da regra do parcelamento.
Outras soluções para o pagamento de precatórios seriam a venda de ativos da União e o encontro de contas com estados, municípios e pessoas jurídicas que têm dívidas com a União.
Apesar da defesa do governo, deputados de diferentes partidos apresentaram dúvidas quanto à PEC dos Precatórios.
Adriana Ventura (Novo-SP) teme que a PEC afete as expectativas do mercado sobre o pagamento de dívidas do Tesouro. “Sei que o dinheiro é limitado, mas precatórios são dívidas. É um calote institucionalizado na minha visão. Como isso mexe com os investimentos?”, questionou.
Por sua vez, Carlos Zarattini (PT-SP) afirmou que a Advocacia-Geral da União deveria ter maior controle sobre os precatórios, e que o aumento nas despesas poderia ter sido previsto. “A PEC rompe o teto. A cada meteoro, vamos ter uma nova PEC?”, indagou.
O relator da LDO, Juscelino Filho (DEM-MA), apoiou a ideia de encontro de contas para honrar o pagamento de precatórios, já que muitos municípios têm dívidas com as União. “A gente sabe do momento difícil que vivemos e ainda com teto de gastos para ser cumprido.”
Contas
O secretário do Tesouro comentou que os principais desafios neste ano são controlar o déficit nas contas públicas e ao mesmo tempo combater a pandemia, o que pressiona os gastos do governo.
Por causa da queda da arrecadação e despesas como o auxílio emergencial, o déficit chegou a R$ 740 bilhões em 2020, quase 10% do PIB. A dívida bruta pulou de 74% para quase 89% do PIB em 2020. A projeção é que a dívida caia neste ano para 81,2% do PIB, chegando a 80,8% em 2022.
Em 2021, já foram contratados R$ 130 bilhões fora do teto de gastos para cobrir despesas com o auxílio emergencial, vacinas e medidas de proteção ao emprego e empresas. “A gente consegue fazer medidas similares às do ano passado, mas focalizadas. Isso permite mudar a trajetória da dívida”, comentou Funchal.
Depois do bloqueio de despesas no começo do ano, o resultado fiscal melhorou com o aumento de receitas por causa do crescimento da economia e o controle de despesas. A projeção de déficit neste ano, que era de R$ 187 bilhões, foi reduzida para R$ 155 bilhões. “É um ano difícil, porém estamos conseguindo evoluir em 2021 de forma bastante positiva.”
Na avaliação do secretário, as contas públicas melhoraram por causa da redução de gastos com benefícios previdenciários, Bolsa Família, pessoal, subsídios e financiamento estudantil.
Somente com pessoal são R$ 3 bilhões de economia. No Bolsa Família, R$ 9,5 bilhões foram economizados porque as famílias já estavam sendo beneficiadas com o auxílio emergencial.
Juros
Apesar da melhora fiscal em relação à dívida do ano passado, os juros de longo prazo para 2030 estão acima de 10%, em um patamar superior a países como Chile, Colômbia e México. Funchal explicou que, por causa do aumento da dívida, o Tesouro teve dificuldades na rolagem de títulos. Entre 2015 e 2019, o Tesouro tinha que emitir entre R$ 50 bilhões e R$ 60 bilhões por mês. Neste ano, as emissões estão em cerca de R$ 143 bilhões, quase três vezes acima.
No entanto, os prazos de emissão têm melhorado. Por causa da incerteza com a pandemia e o crescimento da dívida, o prazo médio dos títulos havia reduzido de cinco para dois anos. “Passando os sinais corretos de responsabilidade fiscal, mesmo com um nível de emissão mais alta, as novas emissões estão agora com o prazo médio de cinco anos, voltando para o patamar de antes”, disse o secretário.