Segundo dados citados pelo portal UOL, entre outubro de 2020 e setembro de 2021 483.846 famílias foram detidas tentando acesso aos EUA pela fronteira mexicana. Entre essas estão 43.867 famílias brasileiras, uma quantidade que chama a atenção, visto que antes, no ano fiscal de 2020, o número de famílias brasileiras foi de 6.414, segundo autoridades norte-americanas.

Além do mais, de acordo com a BBC, 150 brasileiros têm sido detidos por dia ao cruzar a fronteira do México com os EUA em 2021. Assim, o Brasil é a 8ª nação que mais envia emigrantes de forma irregular aos EUA. A subida é impressionante e a quantidade de nacionalidades tentando atravessar a fronteira México–EUA também aumentou: cada vez mais pessoas oriundas de Honduras, El Salvador e Guatemala são detidas na tentativa de acesso ilegal aos EUA.

A situação é preocupante e sinaliza problemas estruturais e sociais bastante profundos nas Américas. Tendo em conta este cenário, a Sputnik Brasil teve uma conversa com Bruno Corim de Oliveira Castro, advogado e especialista em Mobilidade Global na empresa de consultoria Global Mobility, sobre o problema da migração brasileira e sobre sua opinião a respeito da política migratória dos EUA.

Em busca de uma vida melhor

Tendo em conta esses dados recentes, podemos constatar que a crise migratória norte-americana está em ascensão. Bruno Corim de Oliveira Castro concorda que um dos fatores que intensificou esse problema é a pandemia da COVID-19, mas, sem dúvida, ela não pode ser analisada de forma isolada.

Um ponto bem crucial, na opinião do advogado, que empurra muitas pessoas para os EUA para buscarem uma vida melhor é a falta de “esperança na retomada econômica dos países”, principalmente no Brasil e na América do Sul, e na América Central também. Muitos acreditam que, infelizmente por alguns erros de planejamento durante a pandemia, a economia desses países vai demorar a se recuperar.

Crises políticas existentes nos países das Américas Central e do Sul, a violência, a falta de educação e também uma expectativa de ter uma vida melhor nos Estados Unidos são outros elementos que contribuem ao assunto.

Política migratória dos EUA: fator agravante?

O aumento dos migrantes também reflete um período semelhante ao que se seguiu à posse do presidente Joe Biden, que prometeu uma postura diferente de seu antecessor Donald Trump nas questões migratórias.

O especialista relembra que o cenário da crise migratória é um pouco mais antigo e já existia na presidência de Donald Trump. Muitos procedimentos que foram adotados em relação aos imigrantes pelo ex-presidente Donald Trump foram “medidas reprováveis, que são realmente muito controversas, desrespeitando totalmente os direitos humanos”, opinou.

Ao contrário, o governo Biden está adotando algumas medidas para tentar uma abordagem mais humana referente à migração. Era um dos pontos de sua campanha eleitoral, juntamente com a sua vice-presidente Kamala Harris.

“Esse discurso, que seria mais benéfico aos migrantes, acabou chegando em diversos países, e até de forma distorcida, que os Estados Unidos estariam de portas abertas para imigrantes, inclusive ilegais”, nota o advogado, acrescentando que nós ainda não vimos medidas efetivas, principalmente para os migrantes ilegais.

Entretanto, Joe Biden melhorou em algumas questões as políticas migratórias, segundo ele. Em particular, o presidente colocou algumas pessoas no comando das operações, das agências e dos departamentos migratórios que são imigrantes ou que têm origem em familiares que são imigrantes. A própria Kamala Harris tem histórico de sua família de imigração para os Estados Unidos, aponta o especialista. A mudança da mentalidade já é um grande passo, acredita o advogado.

“Apesar de todas as informações que às vezes chegam no Brasil ou nos outros países que os EUA não é um país que é favorável aos imigrantes, mas os EUA é um país de imigrantes, precisa de imigrantes, mas […] legais, que entrem na forma correta.”

No entanto, a adoção de uma política migratória mais humana vai demandar tempo, precisa até de uma união entre o Executivo e o Legislativo, considera ele.

Por que famílias brasileiras tentam sua sorte na travessia?

Conforme o advogado, no cenário brasileiro não existe um único fator para explicar o aumento da imigração do Brasil para os EUA e é preciso analisar o histórico como um todo.

O primeiro motivo é mais abstrato: “Nós, os brasileiros, já temos a cultura de acreditar que nos Estados Unidos você vai ter uma melhor segurança, uma melhor qualidade de vida, você vai receber uma moeda mais forte, que o seu poder de compra nos EUA é melhor”, elenca ele os pensamentos gerais que levam muitas pessoas a terem esse objetivo de morar nos EUA.

O segundo elemento são as consequências da pandemia, que acabou trazendo uma grave crise, tanto política quanto econômica. Muitos perderam seu emprego e acabam migrando para o exterior, algumas empresas saíram do país nesse período, principalmente do setor automotivo, como a Ford, por exemplo.

Além disso, observamos no Brasil uma diminuição no incentivo à pesquisa e à tecnologia que em outros países existe. “Se a gente for analisar esse período pós-pandêmico, profissionais principalmente ligados à saúde, ligados à engenharia, ligados à tecnologia de informação, vão ser muito requisitados. E países, assim como os Estados Unidos, que dão incentivo para essas áreas, eles vão precisar de mais trabalhadores”, prevê o especialista.

Migração ilegal: vale a pena?

Para o especialista, a migração ilegal sempre tem mais riscos do que benefícios. Acreditar que viajar em família ou com crianças pode facilitar o processo de migração é algo ilusório, avisa ele.

“O risco da emigração é muito alto. Você acaba entrando aí num jogo que você pode perder ou ganhar.”

Teve um caso recente de uma brasileira que estava tentando atravessar para os EUA pelo México e acabou falecendo. Há casos de pessoas que pagam até 100.000 reais, ou até mais, para atravessar ilegalmente e não conseguem. “Você tem que colocar isso na balança”, diz.

O especialista considera que no Brasil existe uma falta de informação para as questões migratórias, então disseminar as informações oficiais é um ponto crucial para que isso melhore. Quanto aos EUA, a primeira medida que o governo pode fazer, do ponto de vista do advogado, é uma melhor divulgação de informações migratórias corretas e oficiais, sobre os vistos que existem e sobre as possibilidades no processo.

Além disso, eles podem estudar também quais profissionais os EUA precisam e que mão de obra está faltando, trabalhar em cooperação com empresas, como a McDonald’s, e trazer imigrantes para trabalhar nessas áreas.

Quais medidas uma família deve tomar antes de decidir emigrar?

“Migrar para qualquer país do mundo não é fácil, mas é possível”, acalma o advogado. Se vocês decidirem mudar de país, o essencial é fazer um planejamento pessoal e financeiro, conversar com sua família e planejar as finanças.

Ele insiste no fato que é necessário procurar as possibilidades de migrar legalmente, buscando toda a informação disponível.

“Antes de você decidir fazer essa grande mudança na sua vida, faça o planejamento, busque informações, e talvez você consiga um visto para morar legalmente nos Estados Unidos.”

Em uma recente pesquisa, foi constatado que nos últimos dez anos os EUA aumentaram mais de 400% a emissão de vistos a profissionais e pesquisadores brasileiros com conhecimentos excepcionais em suas áreas. Se a gente for analisar hoje, os EUA abrigam a maior comunidade brasileira no exterior. São em torno de 1,7 milhão de pessoas que querem mais segurança, educação e salários mais competitivos.

Por sua parte, o especialista contou que sua qualificação acadêmica pode ajudar a emigrar para os EUA. Uma categoria de vistos que hoje mais cresceu, principalmente dentro da comunidade brasileira, é o visto dos EBs (employment-based), ou seja, dos baseados em emprego. O que é importante saber é que muitas vezes esse profissional que quer ir para os EUA pode conseguir aí um visto que seja baseado nessa sua qualificação profissional.

Em regra, um profissional que seja graduado e que tenha pelo menos cinco anos de graduação, ou um profissional com ensino técnico ou tecnólogo que tenha pelo menos dez anos de experiência, pode aplicar a um dos vistos mais solicitados, ao visto EB-2 NIW.

Enfim, concluiu o advogado, “uma das maiores virtudes do imigrante é ter paciência, porque não é possível mudar a vida de uma hora para outra, isso demanda tempo”.

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