“Bolsonaro recuperou o PT”. “Presidente perdeu 30% do seu eleitorado desde 2019”. As análises são de Marcelo Vitorino, especialista em marketing eleitoral e figura conhecida nas campanhas de políticos conservadores.
No início de 2019, embora setores da esquerda preconizassem o pior dos mundos com a eleição de Jair Bolsonaro, havia um clima de euforia no ar bastante perceptível até mesmo para o mais radical dos petistas.
Goste ou não, Jair Bolsonaro foi eleito com 55,13% dos votos válidos, e quando subiu a rampa do Palácio do Planalto, ao seu lado estavam importantes atores e segmentos da sociedade brasileira, como empresários, a imprensa, o agronegócio e as igrejas neopentecostais.
Em razão de suas inúmeras promessas ao longo de 2018, as expectativas eram altas para aquele que se dizia o primeiro governo conservador desde a redemocratização. Seria ele o responsável por combater a corrupção, aplicar as reformas necessárias ao Estado, e recolocar o Brasil nos trilhos do desenvolvimento. Essas eram as promessas.
Passados três anos, o sentimento de terra arrasada que assola o país é latente, e o futuro promissor anunciado nunca chegou. O que aconteceu com o governo de Jair Bolsonaro? Por que as reformas não saíram do papel? Ele conseguirá ser reeleito em 2022? A Sputnik Brasil conversou com Marcelo Vitorino, especialista em marketing político, para compreender se os conservadores terão uma chance no pleito que se aproxima.

Onde os erros começaram…

Marcelo Vitorino atua como consultor para campanhas políticas por todo o Brasil, com participação ativa na formulação de estratégias para campanhas como as de Gilberto Kassab, Marcelo Crivella e Emanuel Pinheiro. Para ele, os erros do presidente Bolsonaro começaram ainda em 2019, quando diversas reformas foram deixadas de lado.

“O que ele deveria ter feito no primeiro ano de governo era se pautar pelas reformas administrativa e tributária. Mas esse gato agora subiu no telhado”, comentou.

O especialista acredita que o descrédito geral com o governo agravou-se em razão dessa demora. Embora não fosse possível adivinhar, no ano seguinte o Brasil foi atingido pela pandemia da covid-19, tornando mais difícil pautar o tema das reformas enquanto o Congresso e a sociedade discutiam vacinas, lockdown e as consequências do isolamento social para o mercado de trabalho.
A ausência da reforma tributária, em um momento em que os principais países do mundo voltaram-se à proteção de seus parques industriais (por causa da pandemia), provocou um cataclismo na indústria brasileira.
Embora o governo brasileiro se defenda dizendo que foram aprovados alguns marcos regulatórios, a desindustrialização do Brasil é um fato: de 2013 a 2019, o país perdeu 28.700 indústrias e 1,4 milhão de postos de trabalho no setor. A COVID-19 apenas agravou esse cenário.
A análise de Vitorino é que ambas as reformas (administrativa e tributária) não acontecerão em 2022, situação que expõe o governo ao descrédito, pois tanto Bolsonaro quanto seu ministro da Economia, Paulo Guedes, prometeram uma gestão essencialmente reformista.

“O desafio será melhorar a economia sem as reformas”, disse Vitorino, dando a “batalha como perdida”, e acrescentando que, em contrapartida, o presidente terá o Auxílio Brasil.

As chances de Bolsonaro em 2022

Apesar da crise econômica e seus reflexos inflacionários, o especialista avalia que as chances para Bolsonaro ser eleito em 2022 dependem do bom uso da máquina pública. “A máquina pública sempre tem grande peso eleitoral”, comentou.
Bolsonaro teria a oportunidade de melhorar os seus índices com a distribuição do novo Auxílio Brasil, embora sua campanha ante a COVID-19 seja sempre uma lembrança das 600 mil vítimas.
Além da questão do auxílio, que tende a recuperar o prestígio perdido ao menos entre os mais pobres, Jair Bolsonaro terá como uma carta na manga para 2022 as obras do ministro Tarcísio Freitas. O prestígio do responsável pela pasta da Infraestrutura inclusive o credenciou para disputar o governo de São Paulo, estado mais importante do país, tratando-se de economia.

“Porém, este é um governo muito despreparado administrativamente. Existem poucos ministérios que funcionam adequadamente. Se fosse um governo profissional, a máquina pública teria um peso enorme. O problema do Bolsonaro está até no tempo, pois até o orçamento foi feito praticamente no fim do ano”, disse o especialista.

Nesse sentido, Marcelo Vitorino explicou que há pouco tempo hábil para o governo fazer bom uso da máquina pública, de modo a convencer a população das obras e iniciativas do governo. A Justiça Eleitoral estipula como prazo máximo o mês de maio para que políticos inaugurem obras em ano de eleição.

“Do ponto de vista da comunicação, quatro meses [de janeiro a maio] servem para mostrar o que você fez nos últimos anos, e não o que você realiza no primeiro semestre do ultimo ano, porque não dá tempo de o povo fazer juízo de valor. A corrida do presidente é contra o tempo”, avaliou.

Como recuperar os votos dos conservadores?

Pesquisas indicam que, a despeito de Jair Bolsonaro, o conservadorismo no Brasil aumentou entre todas as faixas etárias e de renda, em ambos os sexos, em todos os níveis educacionais e em todas as religiões. O fenômeno revela que há margem para o crescimento de Jair Bolsonaro nas pesquisas, mas será preciso cautela e ações convincentes.
A Sputnik Brasil perguntou para Vitorino em quais áreas o presidente pode ou deveria focar se quiser melhorar seu desempenho junto aos eleitores. O especialista entende que “ele vai precisar se agarrar às questões da moral, da família, e, principalmente, ao conservadorismo”. Porém, não será fácil como aconteceu em 2018.
Embora os brasileiros sejam reticentes com relação aos temas considerados progressistas, como aborto e drogas, as circunstâncias que envolvem as eleições presidenciais de 2022 serão distintas das do último pleito. “Em 2018, havia um sentimento anticorrupção muito forte, com Lula preso, a Lava Jato. Porém, em 2020, as pautas mudaram”, disse Vitorino.
“Parece uma unanimidade entre especialistas que a economia será o tema principal das eleições presidenciais deste ano. Marcelo Vitorino acredita que os problemas do Brasil não casam com a agenda do presidente Bolsonaro: “O brasileiro está olhando para a comida na mesa, e o Bolsonaro quer falar sobre conservadores e corrupção”.
“O problema econômico é muito grave, e a nossa moeda está muito desvalorizada. A economia foi uma tragédia. Essa é a realidade. As pautas morais não avançaram. Esse governo teve um problema para entregar suas promessas. A capacidade gerencial do governo foi fraca”, comentou.
Chegada de Luiz Inácio Lula da Silva no páreo para 2022 mudou o cenário e as perspectivas para a eleição. Crédito: Reprodução/lula.com.br
Chegada de Luiz Inácio Lula da Silva no páreo para 2022 mudou o cenário e as perspectivas para a eleição. Crédito: Reprodução/lula.com.br

Uma base eleitoral praticamente extinta…

Ao ser eleito em 2018, o presidente Jair Bolsonaro revelou-se um político muito mais hábil do que apontavam alguns analistas. Sua base eleitoral nas forças de segurança do país, como polícias e Exército, é praticamente inabalável.
Mesmo com a saída do ex-ministro Sergio Moro de seu governo, e embora isso tenha arranhado sua reputação entre os lavajatistas, Bolsonaro ainda goza de alto prestígio entre soldados, sargentos e capitães. Ele ainda soube catalisar o setor mais importante da economia brasileira, o agronegócio, e, a partir de uma série de decretos para liberar mais áreas para pastagem e mais agrotóxicos para promover as lavouras e as plantações de soja, ganhou a confiança do setor.
Porém, a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva no páreo para 2022 mudou o cenário e as perspectivas para a eleição. Marcelo Vitorino avalia que o “novo Bolsa Família deve melhorar apenas um pouco a imagem do presidente” junto às famílias mais pobres.]
Bolsonaro, contudo, “não deve ter uma base eleitoral que passe de 30%. Ele deve ficar com 22%, 21%. Ele perdeu 30% do seu eleitorado desde que assumiu. É improvável que ele suba nas pesquisas, mesmo com o auxílio nas ruas”, destacou.

Além disso, há outro problema evidente, diz Marcelo Vitorino: “Bolsonaro não é um gestor conhecido pelo assistencialismo, e ele vai disputar com o Lula, que é um gestor assistencialista reconhecido. A reputação pregressa do Lula causa problemas para Bolsonaro também nesse sentido”, avaliou.

Compreender essa questão é fundamental para avaliar por que Bolsonaro segue perdendo votos, segundo apontam as recentes pesquisas. O especialista em marketing político considera que “não eram os grupos [de poder, como o agronegócio] que apoiavam o Bolsonaro, mas o Bolsonaro apoiava o interesse desses grupos, o que é diferente”.

“Há um eleitorado que apoiou o Bolsonaro em detrimento do PT, como médicos, o agronegócio, lavajatistas e outros. O movimento bolsonarista representou o interesse desses grupos. Porém, as pessoas apoiavam uma ruptura com o modelo político que estava acontecendo, e não necessariamente o presidente”, disse.

Com o passar dos anos, o entendimento do especialista é de que Bolsonaro minou o vínculo que sua candidatura tinha com essas pessoas. “O que restou foram alguns ruralistas, evangélicos e armamentistas”, disse Vitorino, enfatizando em seguida que Lula cresce também entre esses segmentos da sociedade.

“E embora o presidente Bolsonaro insista na tese de que não existe corrupção em seu governo, as empresas listadas na bolsa perderam R$ 600 bilhões no ano passado. Os lavajatistas também não voltam mais. O antipetismo está dividido, entre Sergio Moro e Bolsonaro. Pelas pesquisas, o Bolsonaro recuperou o PT”, concluiu

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