Depois da Saúde em 2021, chegou a vez do Ministério da Educação (MEC) estar no olho do furacão da política brasileira.
No ano passado, denúncias de negligência e corrupção no Ministério da Saúde e a inação do governo federal em adquirir vacinas contra o coronavírus levaram à criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid no Senado Federal. Agora, uma nova CPI deve investigar suspeitas de corrupção no MEC em favorecimento de pastores com verbas públicas.
Nesta terça-feira (5), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), confirmou que fará a leitura em plenário do requerimento de abertura da CPI do MEC, mas a instalação da comissão só deverá ocorrer após as eleições de outubro deste ano.
No anúncio, o parlamentar indicou que pretende abrir caminho para duas CPIs do MEC. Além do caso atual, há um pedido de abertura de uma comissão para apurar obras do ministério de gestões passadas supostamente inacabadas.
“Os requerimentos serão lidos em plenário por dever constitucional, e questões procedimentais serão decididas. Porém a ampla maioria dos líderes entende que a instalação de todas elas [CPIs] deve acontecer após o período eleitoral, permitindo-se a participação de todos os senadores e evitando-se a contaminação das investigações pelo processo eleitoral”, afirmou Pacheco após reunião com os líderes partidários.
A CPI da Covid, em 2021, não acarretou consequências significativas ao governo nem aos supostos responsáveis por má gestão na Saúde, superfaturamento de vacinas e outras acusações indicadas ao fim da comissão.
Porém, no caso do MEC, há reais perspectivas de se abrir caminho para condenar responsáveis por supostos crimes contra a administração pública? Quais os reais custos para o país em promover uma nova CPI? A população pode esperar mudanças e benefícios para a educação brasileira?
Para o cientista político Sérgio Praça, professor e pesquisador da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV), a CPI do MEC terá maior possibilidade de ser bem-sucedida em comparação à da Covid.
O especialista avalia que o escopo da nova investigação será bem mais específico e preciso, voltado ao caso do favorecimento a pastores e prefeituras. Segundo ele, na CPI da Covid, muitas das denúncias também diziam respeito a municípios e estados, o que fugia da alçada do Senado.
Praça aponta que com relação ao MEC há “muitas provas e indícios de corrupção” bem localizados e revelações avançadas.
“Uma CPI [do MEC] poderia ser a certeza de pegar os culpados, investigar mais e enviar para o Ministério Público as sugestões de medidas de responsabilização”, afirmou o cientista político.
Para o especialista, outra vantagem dessa CPI seria expor problemas estruturais do combate à corrupção no governo federal.
“Um exemplo que é simples: no FNDE [Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação], assessores de alto nível estavam implicados nos escândalos. O que pode ser feito para aperfeiçoar a seleção desses assessores? Que medidas de transparência poderiam ser instruídas para deixar as questões mais claras?”, sugeriu.
Praça classificou ainda a decisão de Rodrigo Pacheco de postergar a abertura da CPI para depois das eleições de “lamentável”. Segundo ele, é indefensável a justificativa de aliados do governo de que a comissão serviria de “palanque eleitoral”, já que, em sua avaliação, há fatos concretos que precisam ser investigados desde já.
“Não tem essa de palanque. Não se pode cometer crime. E o que importa mesmo para eleição é a economia, a inflação… Uma CPI focada na Educação, no FNDE, não teria esse impacto eleitoral”, analisou.

‘Custo compensa’ e está ‘embutido no Parlamento’

Já José Paulo Martins Júnior, professor de ciência política da Universidade Federal Fluminense (UFF), não acredita que o melhor caminho para investigar problemas de corrupção seja uma CPI. Ele aponta que, no geral, esse papel deve ser da Polícia Federal e do Ministério Público, e as CPIs podem funcionar como instrumento adicional.
Porém o especialista avalia ser válida a instauração dessa CPI, devido ao que classifica de um “aparelhamento” dos órgãos tradicionais de combate à corrupção.
“O caso que vivemos agora, com um aparelhamento do Ministério Público, da Procuradoria-Geral da República e da Polícia Federal, acho que a CPI é instrumento importante de pressão, botando o governo nas cordas. É o papel da oposição. As CPIs são instrumentos de ação da oposição, das minorias”, lembrou Martins Júnior.

Por outro lado, o especialista não entende que a CPI deva resultar em benefícios para a educação brasileira. Segundo ele, a educação é uma das áreas mais complexas da política pública, já que envolve a necessidade de coordenação entre os três entes federativos — municípios, estados e a União.

“Há uma grande desigualdade nas redes de ensino municipais e estaduais. É um problema bastante sério de ser equacionado. Do governo Bolsonaro, não vai sair absolutamente nada que abra qualquer perspectiva de benefício para a educação brasileira”, afirmou.

Sobre eventuais custos que uma nova CPI poderia gerar, Martins Júnior aponta que estariam “embutidos no Parlamento brasileiro”.

Além disso, segundo ele, “governantes que abusam” de áreas como as da Saúde e da Educação são obrigados a ficar “mais atentos ao trato da coisa pública”.

“Senadores têm dezenas de assessores, gabinete, dinheiro de liderança e verba de CPI. O custo compensa. Se a CPI consegue desvendar algo, mesmo que eventualmente não haja resultado concreto, prático, como ocorreu na CPI da Covid, serve para desvendar as falcatruas, as mutretas do governo, as negociatas, como é o caso agora dos pastores”, disse.

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