Em tempos de extrema polarização, um fenômeno chama a atenção: a devoção quase religiosa a políticos, independentemente de lados ideológicos. Enquanto pautas como educação, saúde e redução de impostos são muitas vezes negligenciadas nas ruas, não é raro vermos multidões (ainda que cada vez menores) protestando apaixonadamente em defesa de seus líderes, como se fossem figuras sagradas. O que pode explicar essa dinâmica?

A Antropologia nos ajuda a compreender esse fenômeno ao analisar o papel dos mitos e dos líderes carismáticos. Sociedades humanas sempre buscaram figuras que encarnassem seus anseios e frustrações. Desde chefes tribais até reis divinizados, o culto a líderes políticos é uma constante histórica. No mundo moderno, essa necessidade se traduz na figura do “político-messias”, que promete redenção nacional e se torna um “herói” para seus seguidores.

Na Sociologia, Max Weber já discutia a ideia de liderança carismática, na qual certos líderes despertam lealdade incondicional por serem vistos como portadores de uma missão especial. Em sociedades marcadas por crises econômicas e institucionais, a população tende a buscar segurança em figuras fortes, ainda que em detrimento do debate racional. Essa paixão política está ligada à necessidade humana de pertencer a um grupo, criando uma identidade coletiva onde o político se torna um símbolo.

Além disso, o psicólogo Jonathan Haidt explica que a política opera como uma espécie de “torcida”, onde os eleitores escolhem um lado e passam a defender seu líder como se fosse um time de futebol. Essa fidelidade pode levar à cegueira ideológica, na qual os seguidores ignoram erros e escândalos de seus políticos favoritos enquanto demonizam os adversários.

Outro fator crucial é o papel das redes sociais, que transformaram a política em um espetáculo permanente. Políticos carismáticos sabem explorar essa dinâmica, usando narrativas emocionais para fortalecer o vínculo com seus eleitores. Essa conexão emocional explica por que muitos defendem seus líderes com fervor, enquanto temas estruturais como educação ou economia são relegados a segundo plano.

A paixão por políticos, portanto, é um fenômeno complexo, resultado de fatores históricos, sociais e psicológicos. Enquanto a sociedade não desenvolver uma cultura política mais racional e baseada em propostas concretas, o culto a “políticos de estimação” continuará a ser uma realidade.

Rafael Resende é consultor em gestão pública e ciências políticas, analista político e autor do livro “90 Projetos para Municípios”.

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