Por Roger Darashah, fundador e diretor da Latam Intersect PR e especialista em construção de pensamento de liderança
A indústria de criptomoedas na América Latina avança na promessa de autonomia financeira e na incerteza regulatória. Não basta inovar em tecnologia, o sucesso do ecossistema cripto depende da capacidade dos líderes de determinadas empresas do ramo de construir narrativas persuasivas, gerar confiança e posicionar esses ativos como alternativas viáveis. No entanto, até que ponto esse pensamento de liderança impulsiona uma mudança real e sustentável na região?
El Salvador e o Bitcoin: um experimento pioneiro na criptoeconomia
Quando Nayib Bukele anunciou, em 2021, que El Salvador adotaria o Bitcoin como moeda de curso legal, colocou o país no centro do debate global sobre a evolução do dinheiro e a soberania financeira. Seu protagonismo desafiou organismos tradicionais e abriu um debate sem precedentes sobre a descentralização econômica e a adoção de novas tecnologias financeiras.
Para além do simbolismo, sua visão gerou avanços concretos: a instalação de caixas eletrônicos de Bitcoin e a carteira digital Chivo facilitaram o acesso a pagamentos digitais para milhares de salvadorenhos, especialmente aqueles excluídos do sistema bancário tradicional. Além disso, a decisão posicionou El Salvador como um referência em inovação financeira, atraindo a atenção de investidores e empreendedores do ecossistema cripto. Embora a volatilidade do Bitcoin e a curva de adoção apresentem desafios, a iniciativa estabeleceu um precedente que outros países observam com interesse. Bukele exerceu um thought leadership (o chamado pensamento de liderança) que impulsiona o debate global sobre autonomia financeira e o papel das criptomoedas em economias emergentes.
Fora da política governamental, outros atores assumiram o thought leadership na indústria cripto com um enfoque mais pragmático. Mauricio Tovar, cofundador da Tropykus Finance, é um exemplo de como a tecnologia blockchain pode ser utilizada para solucionar problemas estruturais, como a falta de acesso a serviços financeiros em comunidades vulneráveis.
Tovar tem trabalhado na educação e promoção de ferramentas descentralizadas que permitem mais pessoas a ingressar no ecossistema financeiro sem depender de bancos tradicionais. Ao contrário da aposta de Bukele, sua liderança se concentra na aplicação direta e tangível da tecnologia, em vez de um experimento econômico em nível nacional.
O thought leadership no mundo cripto tem o potencial de transformar economias e desafiar modelos financeiros desatualizados. No entanto, na América Latina, onde a desigualdade e a informalidade econômica são desafios persistentes, é fundamental distinguir iniciativas que realmente geram inclusão daquelas que apenas captam atenção midiática sem resolver problemas estruturais.
Tanto Bukele quanto Tovar representam duas faces de um mesmo fenômeno: a busca por novas soluções financeiras por meio da criptoeconomia. Enquanto alguns veem nessas iniciativas o futuro do dinheiro, outros alertam para os desafios de adotar tecnologias em evolução.
O fato é que a América Latina não está apenas experimentando com ativos digitais, mas também liderando a conversa global sobre sua viabilidade. Nesse processo, o thought leadership desempenha um papel crucial: definir narrativas, construir confiança e converter visão em adoção real. A pergunta já não é se a revolução cripto avança, mas quem definirá seu caminho.
**Roger Darashash é cofundador da Latam Intersect PR