Uma gastronomia que transforma a vida das comunidades. Sabores que trazem memórias culturais e ainda promovem o não desperdício dos alimentos. Tudo isso aliado à remuneração justa e capacitação dos trabalhadores. Essa é a proposta do movimento da gastronomia social que o Caminhos da Reportagem apresentou neste domingo (27) na TV Brasil.
A equipe foi até a comunidade quilombola Cafundá Astrogilda, na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro, para conhecer o restaurante que funciona lá, aberto ao público, sob o comando de duas mulheres quilombolas. Certificada em 2014 pela Fundação Cultural Palmares, a comunidade, localizada no Parque Estadual da Pedra Branca, é composta por descendentes da matriarca Astrogilda, que dá nome ao local.
Na comunidade quilombola, moradores lutam para manter as tradições, incluindo a culinária, e buscam a segurança alimentar por meio da utilização das chamadas “plantas alimentícias não convencionais”, como a ora-pro-nóbis e a taioba, que crescem naturalmente no local.
“A nossa culinária, desde criança, era uma culinária em que a gente consumia, praticamente, o que colhia da natureza”, disse a quilombola Maria Lúcia Mesquita. Além do trabalho no restaurante, junto com a filha Gizele, ela ainda coordena as aulas de cozinha solidária para a comunidade quilombola.
Também no Rio de Janeiro, a equipe da TV Brasil conheceu o refeitório da organização não-governamental Gastromotiva, inaugurado em 2016. No local, eram servidos jantares solidários para a população em situação de rua, mas com o início da pandemia o espaço passou a ser um centro de produção de quentinhas. As refeições, retiradas e distribuídas por projetos parceiros, são feitas por cozinheiros que tiveram aulas gratuitas de gastronomia oferecidas pela ONG, criada pelo chef de cozinha David Hertz.
Um dos programas da Gastromotiva, o Cozinha Solidária, apoia a confecção de quentinhas por organizações parceiras e oferece formação aos profissionais envolvidos na produção. Em 2021, 1,4 milhão de refeições foram distribuídas em Salvador, Rio de Janeiro, Manaus, São Paulo e Curitiba.
A Lanchonete Lanchonete, associação cultural localizada no bairro da Gamboa, na região chamada de Pequena África, no Rio de Janeiro, faz parte dessa rede. Das mãos das seis mulheres que formam o coletivo Guerreiras da Gamboa, saem semanalmente cerca de 400 pratos feitos numa cozinha “eco afro afetiva”, como descreve Thelma Vilas Boas, diretora da organização.
“Estamos numa região afrodiaspórica, então vamos celebrar tudo o que pudermos de receitas e alimentos de origem ou tradição africana. É ecológica, porque entendemos que agricultura familiar, compostagem e reciclagem fazem parte do trabalho da cozinha; e afetiva porque convocamos as lembranças dos afetos a partir da alimentação”, explica.
Quando o assunto é capacitação, outra referência é a Escola de Gastronomia Social Ivens Dias Branco, em Fortaleza. Criada a partir de uma parceria da Secretaria Estadual de Cultura e da iniciativa privada, a instituição oferece cursos gratuitos com o objetivo de “estimular o protagonismo cultural e social por meio da gastronomia”.
O Caminhos da Reportagem também contou a história do chef de cozinha João Diamante. Baiano, criado numa comunidade do Complexo do Andaraí, zona norte do Rio de Janeiro, ele fez curso universitário de Gastronomia e ficou entre os melhores alunos da sua turma. O destaque lhe rendeu um estágio em Paris, no restaurante do renomado chef de cozinha francês Alain Ducasse.
De lá para cá, João Diamante vem trabalhando numa série de atividades: no seu próprio restaurante, com apresentação de TV e, especialmente, no projeto social Diamantes na Cozinha. A iniciativa utiliza a gastronomia como instrumento de inclusão profissional e social.
“Lá nós temos aulas que vão desde plantar, cultivar e colher os alimentos até a finalização do prato, promovendo sempre uma visão crítica de sociedade”, disse Diamante. As aulas, que no momento acontecem de forma online por causa da pandemia, são gratuitas e voltadas para jovens em situação de vulnerabilidade social.