O Plenário do Senado aprovou nesta terça-feira (9), em dois turnos, a proposta de emenda à Constituição que transforma a renda básica em um direito social (PEC 29/2020). Pelo texto, a Constituição passa a garantir o direito de uma renda mínima, devida pelo Estado, a todo cidadão em situação de vulnerabilidade. A PEC segue para a Câmara dos Deputados.
A proposta entrou na pauta para iniciar seu período de discussão, mas, graças a acordos em Plenário, passou pelos dois turnos de votação na mesma tarde. A aprovação foi unânime em ambos, com 63 votos favoráveis.
De acordo com o texto, as regras para acesso à renda básica serão regulamentadas futuramente em lei. A implementação da renda poderá ser feita por etapas, priorizando os cidadãos em situação de insuficiência de renda.
O autor da PEC, senador Eduardo Braga (MDB-AM), defendeu a iniciativa argumentando que o Brasil precisa de um instrumento perene contra as desigualdades sociais e regionais.
“O objetivo dessa proposta foi incluir a renda básica como uma política pública que não esteja à mercê do governo de plantão. De repente, o governo resolve acabar com a renda básica e acaba gerando insegurança para aqueles que já sofrem. [Impedir isso] foi o princípio básico da nossa emenda”, disse Eduardo Braga.
O senador Antonio Anastasia (PSD-MG), que foi o relator, elogiou a proposta como tendo “um caráter histórico”. Ele promoveu duas mudanças no texto, retirando dispositivos. Um deles estabelecia que as despesas com a renda básica não seriam consideradas para fins do teto de gastos, determinados pela Emenda Constitucional 95. O outro determinava que o gasto com a renda básica deveria ser inteiramente compensado, seja com aumento da arrecadação ou com corte de despesas.
Teto de gastos
Rogério Carvalho (PT-SE) apresentou um destaque para manter o caráter excepcional à renda básica em relação ao teto de gastos. Ele argumentou que nenhum programa de auxílio significativo à população vulnerável poderia se sustentar dentro das amarras do teto — que limita o crescimento global dos gastos públicos a cada ano à variação da inflação registrada no ano anterior.
— Esse programa só se materializará se nós o retirarmos do teto de gastos, para garantir que essa renda possa se viabilizar. O teto de gastos não pode ser uma âncora tão pesada, que gere tanto sofrimento e tantas dificuldades ao povo brasileiro.
Anastasia, porém, observou que o tema da flexibilização do teto é “delicado” e já está sendo explorado em outras propostas em tramitação no Congresso. Por isso, ele preferiu manter a questão fora da PEC. No seu entendimento, a exclusão de uma despesa significativa do teto — mesmo que voltada aos mais pobres — teria consequências indesejáveis, inclusive para os objetivos do programa.
“É bom lembrar que o eventual rompimento do teto de gastos, poderia tornar o processo inflacionário tão agudo que o valor da renda seria dizimado, infelizmente, e não teria lastro suficiente para fazer frente às necessidades.”
O destaque de Rogério Carvalho acabou derrotado por 46 votos a 15. Eduardo Braga cumprimentou o trabalho do relator, mas manteve sua opinião, manifestada no texto original, de que a renda básica deveria ser retirada do teto de gastos, para garantir o socorro à população mais pobre, com insegurança alimentar.
” Uma política pública necessária para o povo brasileiro como a renda básica não pode estar limitada ao teto de gastos. É essencial para diminuir as desigualdades, para combater a pobreza, para matar a fome, e a fome tem pressa.”
Suplicy
Durante a votação, a iniciativa da PEC foi elogiada por vários parlamentares como uma demonstração de sensibilidade do Senado. Para Izalci Lucas (PSDB-DF), a proposta representa “dignidade” para a população vulnerável. Os senadores Flávio Arns (Podemos-PR) e Paulo Paim (PT-RS) lembraram do ex-senador Eduardo Suplicy (SP), que dedicou grande parte de seu mandato a defender a ideia da renda básica. Já a senadora Zenaide Maia (Pros-RN) destacou que, com essa votação, o Senado faz uma boa sinalização para a sociedade.